Biografia:
A partir dos anos 2000, mudanças iniciam ao campo social yoguico brasileiro e outros ventos sopram por aqui. Ventilam com mais intensidade atravessamentos norte-americanos, europeus e indianos com seus yogas: Power Yoga, Iyengar Yoga, Asthanga Vinyasa Yoga encontram brasileiros acostumados ao cromatismo yogaterapia vs swásthyá-yôga, predominantemente. Prof. Hermógenes perde muito sua dominância narrativa devido à doença que o acometeu ao final da vida e, por outro lado, ex-alunos de Luiz Derose vão desgastando seu carisma com denúncias midiáticas de autoritarismo, falso moralismo e abuso sexual em suas, nunca comprovadas, orgias tântricas[1].
Essa abertura a novas perspectivas yoguicas culminam em novas linhas-de-fuga criadoras que adaptam e readéquam, uma vez mais, o processo de transplante do yoga em terras brasileiras. Uma das mais conhecidas é a de um ex-discípulo do Prof. Luiz Derose, nascido Janderson Oliveira, mais conhecido pelo seu nome iniciático Sri Prem Baba. Janderson de Oliveira Fernandes, um paulistano que, desde os 13 anos, é apresentado ao yoga e, mais tarde, se gradua em psicologia, mas de evidente linha novaerista (cf. STERN & GUERRIERO, 2020). Mas será em 1994, quando funda um Centro de Terapias Holísticas, que inicia um novo método yoguico brasileiro que sera exportado até para de volta à Índia: o Awaken Love Yoga aliando ingestão de ayahuasca, psicoterapia e meditação (LABATE, 2004, pp.125; MAIA, 2018, pp.58-87)[2].
Mas a grande guinada na sua vida acontece, como ele relata a partir de uma visão em sonho de um senhor de longas barbas e cabelos compridos aos 14 anos de idade, que diz qua aos 33 anos o conheceria. E, aos exatos 33 anos, em viagem de lua-de-mel a cidade de Rishikesh na Índia, ao adentrar um temple hinduísta dá de frente ao homem de seu sonho, que o reconhecendo, se apresenta como seu mestre Sri Hansraj Maharajji, da tradição Sachcha. Após esse episódio, se converte como discípulo ao mestre do sonho, como não diferiria, e se torna, enfim, Sri Prem Baba, como ele mesmo conta a sua biografia[3].
De volta ao Brasil, (re)cria o seu método Awaken Love Yoga, um sincretismo das técnicas emprestadas (ou inspiradas) do swásthyá-yôga, a inclusão da beberagem ayahuasca da religião nativa brasileira Santo Daime, a psicologia nova era que já praticava e, agora, a doutrina da tradição Sachcha no qual se converte na Índia durante sua lua-de-mel.
Com a morte do mestre Maharajji em 2011, Janderson assume a representação do mais alto grau desta linhagem. Prem Baba, sempre muito carismático e, ocupando uma lacuna de líder do yoga no país, pós Hermógenes e Derose, a biografia de Janderson Prem Baba ganha os holofotes da grande mídia, sobretudo, pela notoriedade que assumiu entre muitos artistas de novela e políticos do Brasil e dos Estados Unidos, como Will Smith, sendo considerado uma espécie de guru pop em todos os jornais e revistas[4].
Entrementes, sua história foi profundamente abalada em meados de 2018, após acusassões e confissão de abuso sexual por discípulas em seus ashrams no Brasil. Ele, então, se auto-retira em silêncio, retornando um ano após barba e cabelos cortados, e já afastado também da liderança da linhagem yoguica Sachcha indiana. Atualmente busca reconquistar seu espaço no campo espiritual do yoga brasileiro, mas sem muito sucesso[5].
Influências:
Janderon Oliveira (Prem Baba) é neto de evangélica e benzedeira (em simultâneo) e de outras influências afro-indígenas, segundo ele mesmo relata e portador de mediunidade ou experiências extrassensoriais, como: visões, sonhos e “sensações que ninguém explicava” (MAIA, 2018, pp.59). Essa vivência familiar de pluralidade religiosa, tão comum entre nós brasileiros, impacta sobremaneira o trabalho com yoga dessa nossa personagem profundamente. Janderson Oliveira já era um fardado da igreja do Santo Daime (convertido a fé daimista) e praticante do swásthyá-yôga do Derose, mas que, curiosamente, alinha, de certa forma, uma perspectiva yogaterapêutica de Hermógenes em seu trabalho psico-espiritual, talvez pela influência nova erista que já comentamos na subseção anterior. É um exemplo vivo das idiossincrasias do yoga malandro (cf. SIMÕES, 2020) no Brasil e todos os jeitos que o yoga no país consegue inventar para se manter vivo e atual, mais do que tradicional.
A religião do Santo Daime, em que Janderson Prem Baba foi adepto, é um sincretismo do xamanismo amerindío peruano do norte da Amazônia com o catolicismo popular, erigido pelas mãos de Raimundo Irineu Serra, negro e analfabeto que na década de 1930 foi responsável por cristianizar o uso da ayahuasca já utilizada na floresta (LABATE, 2004).
A doutrina daimista compreende que seu primeiro mestre recebeu, em estado alternativo de consciência (miração), uma espécie de missão via entidade feminina associada (desencarnada) a Virgem Maria da Conceição ou Rainha da Floresta – como se pode perceber, o tipo revelação das doutrinas ou “métodos” religosos no Brasil é bastante comum: Luis Derose (visão de Bhajavananda), Prof. Hermógenes (lembre-se da carta psicografada por Chico Xavier), Janderson Oliveira (do seu mestre que reecontrará em Rishikesh). O ayahuasca, no que lhe concerne, é uma beberagem preparada pela infusão do cipó jagube ou mariri, com a folha da chacrona ou rainha com forte ação alucinógena. É um potente enteógeno que sempre foi usado (e continua pelas comunidades ameríndias) para adivinhação, comunhão mística e enfeitiçamento desde, aproximadamente, cinco mil anos a.C. entre as populações nativas sul-americanas (SANTOS, 2017, pp.16-18).
Repercussões e Legado:
Janderson Prem Baba, inova, associando o uso ritual da ayahuasca nas práticas do seu yoga, e mais, consegue exportá-lo de volta à Índia. A tradição Sachcha incluiu a beberagem enteógena das florestas brasileiras, por associá-la com a bebida Soma, relatada no Vedas – igualmente, uma beberagem ingerida pelos rishis e brâmanes para alcançar o samadhi, que revelaram as escrituras sagradas do Hinduísmo.
Esse transplante é, sem dúvidas, a repercussão mais original que um yoga não-indiano realiza; e mais, consegue retornar à Índia e ser aceita como tradicionalismo “autêntico” da linhagem ao qual fora iniciado.
Outro legado, por assim dizer, que Janderson Prem Baba abre ao campo espiritual yoguico brasileiro é a verve de líder ou mentor espiritual mais explícita. Antes dele, Hermógenes ou Luiz Derose, por exemplo, por mais que sejam percebidos em seus núcleos como uma especial de lideranças espirituais, nunca ostentaram tais posições efetivamente. Gerações yoguicas posteriores a Janderson Prem Baba, no entanto, já se mostram mais abertas a se declararem mestres de yoga, apresentando suas próprias doutrinas religiosas e não apenas “mascaradas” de terapia ou métodos para alto desempenho. As personagens do campo social yoguico pós-Prem Baba, vão perdendo o seu receio de se mostrarem mais religiosas (BASTOS, 2018).
[1] Cf. https://yogacomacento.wordpress.com/2013/10/28/farsa-do-swasthya-yoga/, acessado 01/12/2020; Cf. http://foraderose.blogspot.com/, acessado 01/12/2020 [2] Cf. http://portaldonic.com.br/jornalismo/2017/12/18/sri-prem-baba-propaga-o-seu-proposito-durante-encontro/, acessado 01/12/2020 [3] Cf. https://www.sriprembaba.org/biografia, acessado 01/12/2020 [4] https://amauryjr.blog.bol.uol.com.br/2017/12/12/will-smith-arrisca-frase-em-portugues-ao-conhecer-sri-prem-baba-em-sp/ [5] https://veja.abril.com.br/blog/veja-gente/o-retorno-sem-alarde-do-guru-prem-baba/
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