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ABC DO PENSAMENTO NÔMADE E SELVAGEM


Aos que estão chegando e perdidos em tudo por aqui, dedico essa canção. Todes yogins, em qualquer tempo, corpo ou história, desejam o fim da alienação|ignorância (vidya) nesse mundão louco sem porteira de ilusões (mayas). Tamojuntes até aqui?


Entrementes, só teoria, doutrina, escritura e filosofia sem ação|prática (salve Damião) não rola nada. Todes yogins autênticos possuem sua própria PRÁXIS: prática_teórica. Toda desalienação, enfim, exige algo passando nos corpos que somos_sendo: algo novo ou antigo revisitado por futuros utópicos.


Desalienar-se (ou deslocamentos em vistas a vidya’s), desse modo, exige corpos cozidos pelo fogo do yoga. Muitos corpos yoguicos desatentos passam a desejar atravessamentos anestesiantes comercializados em farmácias, retiros, instaulas e ashrams sedentários por aí afora: serenos, calmantizantes em docilizações asanásticas, veneram igrejas e suas domesticações marcadas pela fala mansa resignada, adeptos de yogas-igrejas fantasiadas de tradição. Os yogares errantes e selvagens, vivem em yogins autênticos, seja pelas bandas de lá ou de cá, independentes das motrizes estéticas de existências que escolheram: asiáticas, egípcias, maoris, sertanejas ou andinas.


Yogi é, necessariamente, um corpo em desterritorializações inconstantes.

Mas não é passar tudo e qualquer coisa no yogar-nosso-de-cada-dia para se estar em nomadismo e não ser capturado em sedentarismos, é preciso estar atento aos yogares aliados e escapar dos alinhados - prefira os desalinhados e subversivos às autoridades. É ao aumento de potência, prana, tesão, chi, alegrias, orgone, enfim, aos bons encontros: aqueles que se componham conosco. Toda desterritorialização exige prudência para não cair no vazio do nada resignado, opressivo, capitalístico e|ou depressivo, mas que se façam passar coragem.


Para isso, uma desorganização momentânea dos ordenamentos de realidade que nos compõem, exige-se aberturas e fechamentos de espaços, permitindo fluxos migratórios que se aconcheguem, fiquem, fluam em aberturas chakrásticos ou qualquer outra mítica selvagem, antes não visitados ou pouco habitados. Se faz importante testar fechamentos, experienciar ligações ou agenciamentos e possíveis desencontros, decomposições que deverão não passar mais. É uma dança, um esforço (tapas), pois pode não parecer, mas não é assim tão fácil desobstruir passagens de vida, vivenciar a fruição de mundos coloridos e colorindo yogares tesudos. Não é só o gostosinho do final da aula, isso é pobreza, segunda margem, há que se chegar ao fundo do rio sertanejo de Guimarães Rosa.



Experimente perguntar aos yogins e meditadores que conhece, o que se passa nas práxis yoguicas deles. Você verá que a maioria não consegue sair de clichês de livros, gurus e do ouvir falar. São raros os momentos de acesso aos seus próprios rolês, por isso os denomino de autênticos ao invés de “tradicionais”, “hathas”, “vedanticos”, “tantricos” ou qualquer outra tentativa classificatória pelas FORMAS YOGUICAS. Prefiro pensar yogares pelas suas FORÇAS em movimento, aquelas mobilizadas em corpos no ato e os RESÍDUOS de suas vivências, aquilo que ficou impregnado - sempre digo que um diário de bordo yoguico|meditativo é mais importante do que um mat-antiderrapante.


Samadhi aqui é uma geografia em que experiências potentes e prudentes empurram linhas-de-fuga (vivekas) a serem vividas para cima do tapetinho de yoga e, não só pensadas e|ou experienciadas, mas vivenciadas e percebidas.

Após a desterritorialização prudente dos formatos que pensávamos ser, há que estar sempre à espreita e sentir as forças que pedem passagem; são estes mergulhos para a terceira margem do rio ou atravessamentos pelo espelho_purusa que yogins autênticos se constroem. Um bom encontro, aliado ao yoga, revela mundos colorindo suas ideias, sentimentos e percepções - lembre-se sempre que a palheta de cores incluem o cinza. Há toda uma realidade sendo compartilhada, mesmo aquelas abaixo da fina lâmina d'água ou estrato que compõem nossas e de outras tantas vidas conectadas com a nossa: não seria yoga (união, religare, tessitura de yuj) uma conexão humana e não com deuses? Estamos aqui vivendo (nos permitindo viver) outras perspectivas de estar sendo.


Nesta fase 2 do processo yoguico como aliado, surgirão utopias ativas, sacações, fruições estranhas, esquisitas, incômodas… há que se experimentar certo espanto com tudo que não éramos, mas vivem em nós. A práxis yoguica elaborada com tanto prezo na fase 1 é só um jeito de se acomodar a novos jeitos infinitos de estar sendo.

Mas há sempre a necessidade de voltar desse rolê yoguico, pois ninguém pode viver em samadhi ou desterritorializado para sempre; ou se inventa outra cartografia vital e a compartilha - como fez Sidarta, Irineu, Chico, Jesus, Espinosa e Platão - ou a morte por esgarçamento da realidade nos aniquila. Aprender a compartilhar perspectivas viventes é o que separa todos que se pensam "portadores de conhecimentos superiores". É muito perigoso não retornar da fase 2, pois cada processo yoguico autêntico exige presença (a tal da atenção plena, estado meditativo, samyama ou estar à espreita).


Mas o que fica da viagem à Ixtlan? Ritornelos nos (re)visitam diversas vezes. Só conhecemos bem um lugar comendo com os nativos, conversando com locais, se hospedando na casa daquela tiazinha dasantiga, comprando e sendo mangueado pelo artesão com a sua arte exposta. Há uma demoração necessária, não para se sentir do lugar (somos nômades), mas conhecê-lo devagaros_amante, aprender a fazer passar intensidades nos encontros e levar consigo lembranças como pedaços de novas terras para compor as próprias.


Lembra de você visitando um trikonasana ou savasana? Experimente, nesse mesmo encontro, convidar um bandha para dialogar junto. Demore um pouco mais na prosa, no prana... tenta agora um verso.

Nesta última fase yoguica|meditativa, você deverá sentir a reestruturação ou reterritorialização acontecer. Um retorno àquela mesma organização social da realidade de antes, caso contrário, seríamos esquizofrênicos de hospital e não esquizoyoguicos - coletores-caçadores de intensidades possíveis na potencialização de vidas vividas na realidade cotidiana (salve Geórgia). Talvez seja só isso mesmo, tode yogin autêntico, indiferente da estética da existência escolhida que componha ou decida viver, será sempre um yogar da cotidianidade, a vida nômade e selvagem que desejamos. Me diga o que pediu passagem no seu yogar de hoje ou ontem? O que vem, ao longo do seu processo yoguico, insistindo em voltar passar a cada incursão profunda no si-sendo enquanto yogin errante? Há sempre uma geofilosofia ou filosofia do corpo (e haveria outra?) que não se contém na organicidade de veias e hormônios, mas percorre ou serpenteia (kundalini) em corpos não domesticados e indisciplinares: e não seria essa a definição de yoga que tantos buscam? Todo Yoga é uma impostura?

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