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Os 7 Erros do Yogue Distraído





O principal erro do yogue é acreditar que há um saber escondido dentro dele (ou por deuses) aguardando ser descoberto.


O segundo é não acreditar no seu corpo como fonte de tudo o que imagina, sign.ifica e real.iza. Todo mundo externo nos atravessa, cabendo a nós o traduzi-lo como podemos. Toda uma gama de sensações do nosso corpo se avoluma. O que somos é uma ideia que fazemos dos encontros que realizamos. Yogar, assim, não é um processo de purificação e interpretação do corpo à luz de uma metafísica que nos assombra, mas uma maneira de aprendermos a representar o que nos atravessa.


O terceiro erro é a idealização de um "equilíbrio perfeito" que um yogue “realizado” atinge, de forma constante, perene, eterna e imutável. O Pleno existe sem dúvidas, mas é inconstante; isto é, há que estar à espreita para reequilibrar essa plenitude variável constantemente.


Um quarto erro, decorrência da distração dos 3 anteriores, é ser capturado pela crença que existem yogues-realizados. Mas compreenda, é verdade, que existem humanos que se aliaram a algum yogar, se libertando da alienação ou do ignorar corporal. Estes, inventaram um saber trançado pelo social, mas não podem servir como ideais a seguir. Podem auxiliar como gurus (aqueles guias mais experientes ou "trilheiros ou mateiros dasantiga", mas não líderes (O Clero) a servirem como “réplicas” ou modelos imutáveis (ver erro 3). 


Yogue é um experimentador imerso no cadinho do mundo, e não um projeto de servidão humana; é mais um lavrador de si, colhendo o que frutifica das condições ambientais e psicossomáticas do que só se poderia ser. Você, eu e rabo-do-tatu estamos sozinhes (condenados à liberdade) na compreensão de quem estamos-sendo. Mas (e olha a ambivalência linda e a trágica da vida-vivida), sem os outres, “Você” (esse Eu/Self/Ego/Indivíduo) não existiria. Como assim? Sem as frustrações que a sua mãe (ou quem a representou na infância) produziu (no desmame, etc. - ver Winnicott), ainda não teríamos uma imagem totalmente descolada do corpo materno. Mais simples, eu e você, sem passar pelo sofrimento de se perceber não sendo a própria mãe, não perceberíamos (formaríamos uma subjetividade externa e interna) como fonte de nossos próprios prazeres, valores e sofrimentos, ou seja, não seríamos "algo" que experimenta o mundo!


O quinto erro: buscar, como um tolo em busca de ouro no céu, o “sentimento oceânico” como experiência única (e infalível) da “libertação” e plenitude eterna. Esse sentimento de “homeostase eterna” é pulsão pela morte, um desejo por retornar ao estado vegetativo do útero materno, onde não éramos nada além de um protótipo de bicho sem linguagem ou individuação. Esse desejo por deixar de ser o que se é, revela o mesmo medo de Arjuna no início do B.Gita que precisou da intervenção divina para chacoalhar seu corpo (como um cão removendo toda a sujeira do corpo após brincar no chão), e reintroduzi-lo à vida histórica, material e dialética.


Não é que o “sentimento oceânico”, esse “estado de moksa/nirvana/kaivalya/samadhi…” não exista; sim, ele é totalmente verdadeiro e está aí, disponível a qualquer prática mais ou menos bem conduzida e disposta pela tecnologia do hatha, jnana, mantra, restaurativa ou outro método yoguico desenvolvido, mantido e trocado pelas diversas linhagens que souberam sobreviver no sul-asiático (ou se desenvolvem agora entre latino-americanos). Mas é só isso mesmo, uma experimentação do seu corpo (e sua mente, que é uma ideia daquele), como degustação do sabor da maçã, o aroma da lavanda ou o som do vento nas árvores. E daí?


Esse erro vem acometendo muitos yogues a usá-lo (essa experiência divina ou "sentimento oceânico") como referência última do que é Yoga (e a vida, os mais tolos deliram) e se matam debatendo quem possui a descrição (e vivência) mais exata do gosto (e preparação para) sentir o "gosto da maçã" mokshiana.


Sexto erro: acreditar (idealizar) que há uma “linha-de-chegada” no Yoga, tipo faixa-preta 5o.Dan e ponta vermelha. Enquanto vivos (isso porque há muitos yogues vivos, mas que morreram para a vida: celibatários, não podem odiar, alimentos proibidos, se culpam ao pisar numa formiga...) que se esqueceram de suas vidas, dedicando-se ao “serviço/escravidão voluntário” a outro ser humano comum como ele, todavia, que se apresenta (e é comercializado) como extraordinário no antigo mercado de bens-de-salvação humanos. 


Especificamente aqui, tenho dedicado muito tempo da minha vida acadêmica buscando compreender no Yoga como operam a produção de suas próprias ilusões/mayas modernos em vista de um certo movimento nacionalista indiano (mascarado de Yoga) em se mostrar para o mundo, como uma nação "espiritual" ideal, mas que em verdade, têm demonstrado como “aparelhos-de-captura” de "pretendentes a yogues" - esse protótipo de "Pessoa-do-Bem, consciente com o Planeta Verde e o Bem-Estar de Todes" - com egos tão enfraquecidos. Os "Yogues Perfeitos" se vendem como pessoas Fortes, Destemidas, Sem-Dúvidas, Imaculadas, Seguras-de-Si: “imbroxáveis”, pois necessitam de outros humanos - os Yogues Distraídos - tristes, esvaziados, logo, ansiosos por “estarem preenchidos”. É um complexo mecanismo religioso (bastante antigo e fruto de muita pesquisa - ver estudos sobre conversão religiosa, psicologia das massas, etc.) que irá se retroalimentar num ciclo de impotência coletiva (o padre precisa dos seus convertidos para viver, tanto quanto os "servos" do seu "Senhor") que resulta nesta busca eterna que assistimos - "tranquilos e com a boca escancarada e cheia de dentes e esperando a Morte chegar" - por “Bem-Estar” em suas pequenas-doses-de-alegria/felicidade-passiva" que se distribuem (ou vendem mesmo) nos frascos contidas em “aulas de Yoga” anestesiantes - o Soma da "Vida de Yogue".


Sétimo e último erro: acreditar que tudo isso descrito até aqui é fruto da contaminação moderna e/ou distorção de uma “filosofia ancestral” pelo “Ocidente”, “homem-branco-cis”, racismo estrutural, sistema de castas da Índia, interpretação incorreta do Yoga-Sutras ou qualquer outro inimigo que se invente para cegar a responsabilidade de Avidya que se apresenta agora na fórmula barata (e ancestral, inclusive) de busca por Kaivalya, que é o que sempre será, só mais um Maya.

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